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O Breguet de Alverca: Relíquia dos Céus na Catedral da Engenharia Aeronáutica

No coração da antiga Fábrica de Alverca, transformada em Pólo do Museu do Ar, uma aeronave histórica levita em silêncio sobre o visitante: o Breguet XIV A2. Este avião não é apenas um testemunho da aviação militar portuguesa — é também um símbolo da excelência técnica que marcou o século XX. E por detrás do seu nome esconde-se uma genealogia extraordinária: a da dinastia Breguet, que uniu relojoaria, aeronáutica e instrumentação num mesmo legado de precisão.


Breguet Br.14 A2 (1919-1932)
Breguet Br.14 A2 (1919-1932)

Da Relojoaria à Aviação

O Breguet XIV foi concebido em 1916 por Louis Charles Breguet (1880–1955), engenheiro aeronáutico francês e neto de Abraham-Louis Breguet (1747–1823), o génio que revolucionou a medição do tempo. Abraham-Louis Breguet inventou o turbilhão, o repetidor de minutos silencioso e o échappement naturel), entre outros, transformando assim a relojoaria numa ciência de exactidão absoluta. Mais de um século depois, o apelido Breguet voltava a ser associado à vanguarda — desta vez, nos céus da Europa.

Louis Charles Breguet aplicaria a mesma lógica de rigor técnico ao desenvolvimento de aeronaves, como o Breguet XIV — uma das primeiras a utilizar largamente o duralumínio, e que viria a ser fabricada em milhares de unidades durante e após a Primeira Guerra Mundial. O duralumínio (ou duraluminium) é uma liga leve de alumínio desenvolvida no início do século XX, que combina alumínio com cobre, e, em menores proporções, magnésio e manganês.


Instrumentos de Precisão: A Terceira Vertente Breguet


Cronómetro Breguet tipo 12 e relógio de aviação Breguet Type 11 fixos em painel de cockpit, usados para navegação e cronometria aérea.


Menos conhecida do grande público, mas de enorme importância, foi a contribuição da Société des Instruments de Mesure Breguet para a aviação mundial. A partir da década de 1910, os ateliers Breguet começaram a produzir instrumentos de bordo para aviões e balões: altímetros, anemómetros, barómetros, bússolas e relógios de cockpit. Estes instrumentos equipavam muitos dos aviões franceses — tais como os próprios modelos da Breguet Aviation — e eram reconhecidos pela sua fiabilidade em condições extremas.

Até meados do século XX, a marca Breguet forneceu instrumentação de voo de precisão a forças aéreas civis e militares, consolidando-se como um nome de confiança tanto no mostrador de um relógio de pulso como no painel de controlo de uma aeronave.


Aviões Breguet em Alverca

O exemplar de Breguet XIV A2 que se encontra hoje exposto no Museu do Ar, em Alverca, é uma rara sobrevivência da era heróica da aviação. Usado em Portugal entre 1919 e o início da década de 1930, este biplano francês foi empregue em missões de reconhecimento e treino, operando a partir de bases como Tancos e a própria Fábrica de Alverca, então um dos principais centros de manutenção e montagem aeronáutica do país.


Suspenso na nave de tijolo e vitrais da antiga igreja fabril — hoje convertida numa impressionante galeria museológica — o avião surge como um verdadeiro altar mecânico. As suas asas em treliça, o motor em linha refrigerado a ar e o cockpit despojado evocam uma era em que voar era ainda uma extensão directa do espírito científico do século XIX, movido pelo desejo de medir, observar e conquistar o invisível.

No Pólo de Alverca do Museu do Ar, destacam-se actualmente duas aeronaves associadas ao nome Breguet:

  • Breguet XIV A2 – símbolo da aviação militar de entre-guerras, um dos primeiros aviões militares portugueses a operar com ligas metálicas leves, como o duralumínio.

  • Dassault-Breguet/Dornier Alpha Jet – jacto de treino avançado desenvolvido nas décadas de 1970 e 80 pela francesa Dassault-Breguet em colaboração com a Dornier alemã. Este modelo entrou ao serviço da Força Aérea Portuguesa em 1993, marcando uma nova fase de modernização da instrução aérea militar.


Estas duas máquinas — separadas por quase oito décadas — traçam um arco notável da história da aviação em Portugal, ambas com o nome Breguet inscrito no seu ADN, ora como construtor de madeira e lona, ora como fabricante de jactos e instrumentos de voo. Um legado de precisão, inovação e engenho que atravessa os séculos.


O Tempo, o Espaço e a Precisão

A presença do Breguet XIV em Alverca resume, de forma quase poética, o legado da família Breguet: a união entre o tempo, o espaço e a precisão mecânica. Na relojoaria, a missão era medir o tempo com fidelidade astronómica. Na aviação, era conquistar o ar com segurança e rigor técnico. Na instrumentação, era fornecer ao piloto os dados cruciais que ligam a máquina ao mundo exterior.

O nome Breguet atravessa três séculos com um fio condutor: a confiança do engenheiro na inteligência das engrenagens.

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